sexta-feira, 18 de novembro de 2011

nada pra ele escrevi.
talvez por ele, causa de dor.
agora quero dizer do amor
sem anel e sem 'mesmo teto'
e ainda, tão junto, tão perto
e esse tempo todo
e aquilo tudo - que sempre falamos
e o tanto que falamos
por dizer
entre coisas graves ou amenas
o quanto - enquanto -
nos adoramos.

domingo, 18 de setembro de 2011

exercício

Sobre a distância ele podia falar quase tudo, menos da impossibilidade. Duvidava dessa palavra definitiva, entendia o mundo como um escancarado devir. Por isso foi, já acostumado a tanto ir, a tanto andar. Trazia todo o princípio consigo, mas viveria apenas de continuidades agora. Nada de recomeços, porque não era de esquecer. Também não era de lembrar; era todo memória levada no corpo, das manhãs às noites, como uma informação processando em default. Também não colocava nada ali no vazio que o sustentava. Só permitir tudo o que foi e o que virá. Um homem sem medos.
Encontrou entre cinza e fumaça, vermelhos vibrantes e amarelos pálidos. Cobriu-se de azul e cuspiu tons de terra e cobre. Viveu. Apenas indo para frente. Até encontrar a palavra encantadora: ininteligível, indecifrvel, quente, enviada - na verdade, devolvida -  diretamente pro centro de sua alma vagante. Sem direção, deu uma volta em torno do próprio vazio. Paralisado, resolveu obecer a ordem daquela nova loucura. Soube-se aprisionado por uma linguagem estranha, um código sem silêncios. Pela primeira vez, considerou que ir era fugir. E desejou.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

eu que pensei ser salva pela poesia, já engulo água.
qual tempo, esse, de esperança em versos?
qual modo, o das delicadezas ditas serem
banco de areia, barra, coral?
eu que em sonho nadei
no mar das palavras
nem derivo mais

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Pequena teoria do beijo

O beijo é, na economia do mundo, do corpo ou da imaginação, coisa poderosa. Marco sensorial da contabilidade dos dias leves e dos estratagemas bélicos, é um roçar de lingua na vida, pungente ou morno. O beijo é um devorar macio do outro, de quem nos alimentamos para suportar os dias de solidão e mastigação saudável. O beijo é a recusa da racionalidade prática aplicada à rotina da boca - uma completa indiferença ante a composição bioquímica e biográfica da saliva. O beijo é um ato rebelde - das causas mínimas e máximas: se opõe ao conservadorismo dos corpos estáveis. Beija, quem quer pular de si para o abismo do outro. Beija, quem quer salvar-se da monotonia da alma intáctil. Beijam-se,  línguas curiosas, lábios receptivos e corpos silenciosos. Muitas vezes, beijam-se, apenas, os corpos. O beijo resiste expondo o amor a pequenos testes sem comprová-lo. Apesar de sua breve duração, ilude os amantes com lampejos de imortalidade.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Mulherzinhas

Em casa de minha mãe havia muitas meninas. Mulheres, ficamos distantes. Antes aprendemos uma força qualquer, uma inteperança no partir, um medo que nos obrigava à insurgência. E fomos com nossos cavaleiros para reinos evanescentes. Seis mulheres com suas pequenas fábulas costuradas de retalhos antigos. Apesar, nossa solidariedade esteve lá.. Compreensão construída nas pazes feitas após brigas de puxar cabelo.
Ser mulher não veio com facilidade pra nós. Por isso tento entender os códigos partidos.
E sendo mulher crescida na aridez de modelos femininos livres, questiono o agora e lembro que sonhava um tempo de não ter que aceitar uma condição menor que viver o binômio liberdade-verdade.
Ainda não chegou e talvez não chegue. Mas há muito porque lutar, mesmo para aquelas que já manejam o mundo do homem com seus colhões simbólicos. No mínimo, por um mundo em que não mais tomaremos metáforas do universo macho - colhões, bolas, fio do bigode, bala na agulha - para falar de poder e força.
Imagine o mundo ocidental na versão feminina. Como seria o trabalho, o amor, o sexo, o casamento, a maternidade, a escola, a casa, pensados a partir de uma estética e uma ética cuja base é o poder feminino? Não almejo tal cenário. Conheço-me. Demoraria milênios para desnudar todo o olhar construído a partir do referencial masculino. Mas almejo tempo de irmandade, de compreensão legítimas, de diálogo aberto, de possibilidades para além da visão dual que está na raiz do "do dá ou desce"; da visão binária de construção da vida, que o poder masculino nos legou.
Um tempo em que não nos culparemos mutuamente por sermos mais fortes ou mais frágeis, mas bonitas ou mais feias, mas livres ou mais aprisionadas, mas flácidas ou mais duras, mas duras ou mais flexíveis, sem enxergamos o quanto somos mais do mesmo.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Das doenças

Que as relações são incompletas, isso a gente sabe. Que somos imperfeitos? Essa já é velha! O ser humando é egoista! Um pouco de exagero na minha opinião. A novidade, pra mim, é ser bom sem perder nada, nunca. Ser limpo, sem perder tempo, íntegro sem cometer erros, doce e não estar inseguro (e se obrigar a guardar no bolso mais fundo a amargura teimosa), forte sem depender de apoio, amar sem sofrer, ousar sem temer...
Tanta coisa que é porque não é, porque não pode exisitir sem sua contradição e sua fraqueza. "Catre velho serve pra poesia". Um dia desses vi um vídeo do Deleuze dizendo que a gente ama é a doença do outro. Fiquei pensando em quem amo, porque amo. Torci pra não ser assim. Tive medo de nunca me ver livre de tal capacidade. Uma capacidade! Quase achei que a gente ama porque é doente. Pior. E quem não deixa sua doença emergir (de tão doente)? E quem se protege com o fogo fátuo da certeza, no arbusto seco da auto-satisfação?
Aquela história de ser feliz ou ter razão? Ser feliz, ser feliz, ser feliz!! Se isso pudesse. Se existisse. Ter razão é bem mais difícil, até porque ninguém tem  razão em oposição ao desejo de ser feliz, de fazer feliz. Oh, coisa difícil! Oh coisa que foge de mim!

terça-feira, 7 de junho de 2011

Devez

Investi pesado, durante um tempo, em tentar ser a melhor amiga, mãe, esposa, filha... fracassei a maior parte. Hoje sei que essas coisas não dependem do esforço - é preciso, a cada dia, aprender como.
Tem a ver com o que se vai sabendo da vida, das coisas, das dores, das tristezas...
Algumas  andei aprendendo. Outras, ainda tenho que esperar a fruta cair do pé. Nem adianta jogar rebolo, como falava lá em Colinas. Tem tempo pra cada. Novembro é chuva de manga. Junho, de milho. Hoje, é esperar alegremente, enquanto é flor.

terça-feira, 31 de maio de 2011

sábado, 21 de maio de 2011

Cine Colinas


David Cardoso, astro da pornochanchada

Nasci numa cidade muito pequena. Uma época, tinha dois cinemas. Foi quando eu descobri que o mundo era grande. O Cine Rival e o Cine Colinas. O mundo era muito grande. Vi o deserto e um menino picado por um escorpião. Teixeirinha, Dio come ti amo, Os trapalhões, bang bang italiano, pornochanchada. Vi uma cena de sexo pela primeira vez com o braço engessado. Saí escondida de casa e antes de a sessão terminar minha mãe já sabia que estava no cinema. Mandou me chamar.  Minha irmã foi me fazendo medo. Eu pensando no que o Antonio Fagundes e o Ney Latorraca faziam com a Marilia Pera. No cinema só tinham bancos, não tinha cadeira. Às vezes, o filme queimava. Às vezes, a luz apagava. Às vezes eu ia com a empregada lá de casa. Às vezes, trocava o cinema pelo circo. Gostava do circo, mas o cinema era mais todo dia. Acabava a aula e eu via o cartaz no começo da praça. Ainda bem que eu morava no final da praça. Fotos de Saloons, de moças com tarjas pretas, de Renato Aragão e Muçum. Um dia, O Menino no Deserto. Um dia, Dio come ti amo (italiano!). Um dia, chorei no cinema. Eu nasci no cinema. Não de verdade. De verdade, mas no cinema!

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Rosebud




Hoje fui ver Cidadão Kane no cinema. Não, não estou em São Paulo, estou em Maceió mesmo. Saio de casa e, em cinco minutos estou com o ingresso do filme na mão, num cinema de arte (Agradeço a Deus por o longe de casa ser tão perto do cinema). Cidadão Kane. Nem lembro quantas vezes tentei ver esse filme até o fim. Já me sentei na frente da TV algumas vezes com essa disposição, mas nunca conseguia reunir concentração suficiente. O preto e branco na telinha, os outros canais da TV a cabo e todo aquele noticiário no início do filme... muito desafio. Hoje, diante da telona, de mãos quase dadas com a platéia de jovens e velhos cinéfilos, juntos na empreitada de saber o significado de Rosebud. Adorei. Fiquei encantada com a fotografia e com a narrativa não-linear. Uma aula. E, olhe, não há lugar melhor do que uma sala de cinema. Lá, eu me sinto a vontade pra dizer: há, sim, paraíso sem perder o juízo e sem morrer.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Para Larrosa

barulho da chuva. riscos verticais de semitransparência, enquanto se entrega ao processo de ser apenas por enquanto. de reescrever-se nesse dia que é apenas ontem. A chuva é a única testemunha porque é de gotas como ela - são por um agora. logo reconhece que quer é essa potência: guardar futuros de chuva-mistério.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

O mundo é tão maior do que hoje, baby, o mundo é tão... A vida é muito mais rápida que o tempo, darling, a vida é muito! E você, você é bem mais forte do que parece, meu amor, você é bem mais.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Foto: Giselly Lima

E um dia tudo


é velho. uma manhã


e o mesmo envelhecer:


a luz a brisa o roncar distante


de outras vidas


Minha velha presença.


Nada desperta o novo. nenhum


nascimento ou morte. nada


se inaugura ou se despede


por aqui apenas


a roda


para um lado


ou para o outro.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Dúvida - Isadora Lima

A vida nos faz de morto
amado, encanto, encosto
entrelaça o esmiuçado
e devolve outra vez pra alma
como que tendo avisado

que como nos damos depressa:
urgência e curativo
me gasta, recomeça!
me torna o que só sou contigo!

Ferrenha: que voz é essa?
Reaja! -Sibila- Atiça!
Na vazante de um rio calado
me deito, ciente da cura
que no fundo do seu abraço

não sei como divisam seus olhos
estas cores de paisagem!
vísceras de amor que cintilam

ou nuances que ofuscam a verdade?